Belchior, advocacia da concorrência e produtividade
- rafaelk2077
- 22 de mai. de 2017
- 5 min de leitura
Mais produtividade para não vivermos como os nossos pais
Há imortais que, por lógica, nunca envelhecem. O cantor e compositor Antônio Carlos Belchior é um exemplo. Há temas, que, assim como Belchior, não caducam. Advogar pela concorrência e buscar o aumento da produtividade são dois desses. Indubitavelmente estes dois objetivos atemporais planam pelas cabeças de policy makers preocupados com o desenvolvimento do país, logo, com o bem-estar social. Não se deve ter “medo do avião”. É importante voar alto!
Belchior nasceu em 26/10/46 e dizem – será uma “Alucinação”? – que ele morreu “de morte morrida” (diria Gilberto Gil) em 30/04/17. Manifestam, também, que o Cade não deve advogar pela concorrência. Por fim, também se ouve o canto de que o Cade não tenha nada a ver com a produtividade brasileira. Como estas teses são questionáveis, é sempre oportuno: 1) homenagear um grande artista brasileiro que tanto contribuiu para a MPB; 2) advogar que o Cade, única autoridade antitruste brasileira, deva fomentar a concorrência no país; e, por fim, 3) argumentar – e, quem sabe, conscientizar aqueles que nunca refletiram sobre isso – de que esta nobre instituição tem como objetivo mais amplo aumentar a produtividade do Brasil.
As duas últimas teses, por mais questionáveis que sejam, têm fundamento. De fato, o artigo 19o da Lei no 12.529/11 atribui a advocacia da concorrência à Secretaria de Acompanhamento Econômico do Ministério da Fazenda (SEAE/MF). Além disso, é possível inferir, pelas ementas dos cursos de economia, que as soluções para aumentar a produtividade de um país advêm de tópicos da área da “macroeconomia”, mais especificamente, do campo do “desenvolvimento econômico”, não tendo relação com a “microeconomia”. Compreendo estas percepções, mas divirjo de ambas as teses, pois, como diriam Zé Henrique e Gabriel, “tudo está junto e misturado”.
Quanto ao primeiro entendimento, como o legislador não veda a possibilidade do Cade advogar pela concorrência (conquanto afirme que a SEAE/MF é quem deva tomar a dianteira neste processo), é uma interpretação plausível atribuir ao Cade, além dos tradicionais papéis de repressão e prevenção à ordem econômica, o estímulo à concorrência no Brasil, ao lado da SEAE/MF. Mais ainda. Seria adequado que o Cade se tornasse o órgão central nesta empreitada, coordenando a agenda da advocacia à concorrência, de forma interinstitucional.
Com relação ao segundo ponto, como o problema central brasileiro é a sua permanente e baixa produtividade e como algumas das soluções para aumentá-la apresentam aspectos microeconômicos (conquanto também tenham macro), é fato que impulsionar a concorrência é contribuir positivamente para esta importante agenda nacional. Estas duas temáticas (produtividade e advocacia da concorrência), assim, estão interligadas.
Para uma melhor compreensão do porquê desta ligação, antes de prosseguir, vale explicar o que é “produtividade”. De forma resumida e simples, o Produto Interno Bruto (PIB) de um país cresce por duas razões: 1) pelo aumento das pessoas trabalhando (trabalhadores) e 2) pelo aumento de máquinas, equipamentos e tudo mais que esses trabalhadores usam (capital). Todo o crescimento do PIB que não for explicado por estas duas variáveis (resíduo da estimação de uma função de produção), por sua vez, é explicado pela “produtividade total dos fatores”. Essa produtividade, portanto, revela o quão eficiente um país emprega e combina capital e trabalho, lembrando que, enquanto estes dois insumos são finitos, a produtividade pode aumentar se houver adequadas políticas públicas para isso. No longo prazo, assim, dadas as limitações demográficas e de recursos, o objetivo de qualquer Estado deve ser o de incrementar a produtividade do país, uma vez que o objetivo mais amplo é obter um maior desenvolvimento econômico que, no caso brasileiro, significa, necessariamente, ter maior inclusão social, concedendo oportunidades mais equânimes a todos os seus cidadãos.
Para se ter uma ordem de grandeza, recorre-se aos dados. Os americanos, por exemplo, recebem salário médio maior que o dos brasileiros. Isto é justo, pois aqueles são mais produtivos do que estes. De fato. O Brasil, segundo inúmeros estudos, apresentou crescimento medíocre de sua produtividade. Essa está atualmente no mesmo nível que estava em 1980, ao redor de US$ 13 mil/trabalhador. Enquanto isso, nos EUA, esta saiu de US$ 42 mil para US$ 70 mil no mesmo período. Como o padrão de vida de uma nação é refletido pela sua produtividade, para o Brasil convergir para os padrões de países desenvolvidos, não há alternativa senão aumentar a sua produtividade. O Brasil, por isso, precisa estar todo engajado e alinhado nesta meta. O brasileiro, assim, embora não devesse se importar em “ter parentes importantes”, ele quer ser um “rapaz latino-americano com dinheiro no banco” (e não sem!).
Estabilidade inflacionária e contas públicas em ordem são pré-requisitos para se ter um país mais rico, mas, de longe, não são medidas suficientes para aumentar a sua produtividade de forma sustentada. Há políticas públicas que esbarram com a complexa agenda política do país, mas há outras que podem ter resultados num período inferior a 4 anos. Advogar pela concorrência é um exemplo.
Feita esta explicação sobre produtividade, é possível notar a relação de causalidade entre os temas. Advogar pela concorrência é contribuir positivamente com a agenda maior do país (problema central do Brasil), que é determinar políticas com foco no aumento de sua produtividade.
Exemplos não faltam, como: diminuir e repensar o crédito subsidiado e direcionado, melhorar o ambiente de negócio, diminuir a carga tributária (hoje ao redor de 35% do PIB) e a sua complexidade, desburocratizar a economia, melhorar a relação entre as instituições públicas e a qualidade da prestação de serviços destas à população, diminuir e tornar mais eficiente a máquina publica, melhorar a educação do país (privilegiando a básica e a oferta de creches) e investir em infraestrutura (pela via das concessões e privatizações).
Além desses distintos temas, há outros – e agora, relacionando advocacia pela concorrência e potencializar a produtividade – em que o Cade poderia ser proativo, criando incentivos (via, por exemplo, sugestões de novas leis, eliminação ou alteração de outras) para introduzir competição em certos mercados, diminuir falhas de mercado e eliminar barreiras em outros, alterar regulações torpes e desconexas com os reais problemas econômicos e questionar acerca de protecionismo comercial infundado, cujo intuito único é evitar a concorrência externa. Deveras, neste último exemplo, nunca se teve tanto aumento de alíquotas antidumping no país, fato este que afeta contundentemente a competição interna, logo a produtividade. A agenda é, certamente, ampla e deveras otimista (que demandaria ao Cade mais recursos físicos e humanos), mas faria com que o Cade tivesse um papel ainda mais relevante para os brasileiros, contribuindo de forma proativa com o aumento da produtividade brasileira.
Sem as reformas que estão na pauta do dia (necessárias embora não suficientes), a produtividade – maior problema econômico e social brasileiro – seguirá medíocre e o Brasil, fadado ao subdesenvolvimento e às injustiças sociais. Seguiremos com “medo da Hora do Almoço?”. Desta forma, se as instituições de Estado desejam se tornar imortais – assim como se tornou Belchior, que será lembrado eternamente – há que endereçar os problemas estruturais brasileiros, que se resumem em enfocar os tópicos para aumentar a produtividade do país. O Cade pode e deve ser um parceiro nesta empreitada, candidato a tornar-se igualmente imortal nesta vertente.
Diferentemente de como escreveu Belchior, “minha alegria é perceber que por temos feito tudo, tudo, tudo, tudo o que fizemos, é, por isso, que não somos os mesmos, como os nossos pais”. Temos que seguir a caminhada, avançando, portanto, pois “viver é melhor que sonhar” e o “novo sempre vem”. Não adianta tergiversar.
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