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Comissão de Produtividade, uma instituição que falta no Brasil

  • Foto do escritor: rafaelk2077
    rafaelk2077
  • 25 de abr. de 2018
  • 8 min de leitura

Secretaria poderia centralizar avaliação de políticas públicas, hoje fragmentadas, e fazer proposições efetivas


Stefan Zweig era austríaco e, dentre outras profissões, escritor. Imigrante judeu, refugiou-se em Petrópolis/RJ em 1940, durante a segunda guerra mundial, com o avanço das tropas de Hitler na Europa. Escreveu a obra “Brasil, o país do futuro” em 1941 e, ironicamente, parece ter perdido a paciência com o “futuro que não chegava” e se suicidou em 1942. Como construir um país do futuro? Se tivesse tido a oportunidade, teria escrito o seguinte texto para Stefan.


Um país com maior produtividade amplia o seu PIB que, consequentemente, melhora o bem-estar das pessoas que neste residem[1]. É fato que a produtividade no Brasil é baixa e que Comissões de Produtividade estão surgindo no mundo. Há espaço para o Brasil ter uma intuição deste tipo e o modelo institucional a ser instituído pode tomar várias formas. Uma delas seria criar uma agência independente. Outra possibilidade seria aproveitar as duas novas secretarias que surgiram da ex-SEAE/MF. Uma delas poderia focar apenas em Advocacia Econômica da Concorrência (uma nova SEAE), como prevê a lei 12.529/12, e a outra, a se dedicar unicamente na “avaliação de políticas públicas com foco em produtividade”, nos moldes das Comissões de Produtividade existentes ao redor do mundo. Seria, certamente, uma secretaria central para acompanhar a economia e focar no crescimento sustentável do país.


Dita proposta é razoável. Primeiramente porque, como o país tem tido baixa capacidade de aprender com seus insucessos e sucessos, uma Comissão da Produtividade (ou Secretaria da Produtividade) poderia centralizar e coordenar a avaliação das políticas públicas existentes, hoje fragmentadas, e fazer proposições efetivas em prol do aumento da produtividade, aprendendo com o passado. Em segundo, porque Comissões de Produtividade têm surgido, como na Irlanda (1997), na Austrália (1998), na Nova Zelândia (2010), na Dinamarca (2012), na França (2013), no México (2013), na Noruega (2014) e no Chile (2015). Não por menos a OCDE tem feito este debate de forma mais ativa[2].


De fato, o Brasil tem produtividade muito baixa. Se esta não crescer, a nação seguirá perdendo de 7 x 1 com relação a outros países e, mais adiante, de 20 x 0. Logo, nunca será o país do futuro.

Os números desta realidade são incontestes. O livro “Anatomia da Produtividade no Brasil”, organizado por Fernando Veloso, Regis Bonelli e Armando Castelar, referência basilar do relatório do senador Armando Monteiro concernente às razões do Brasil ser tão improdutivo, revela conclusões preocupantes, muito bem descritas por Fernando Veloso em entrevista à Revista Conjuntura Econômica (março/2018, volume 72, IBRE/FGV). De acordo com Veloso e outros acadêmicos[3] há três diagnósticos medulares sobre a produtividade brasileira:


(1) esta é baixa, relativamente à americana, e não tem convergido para a dos países desenvolvidos[4], fato não esperado, devido ao enorme espaço que existe para estes países fazerem um catch up com as nações desenvolvidas;


(2) esta é baixa, relativamente à americana, em praticamente todos os setores, o que mostra que o problema não está na elevada concentração de trabalhadores atuando em setores pouco produtivos da economia;


(3) esta é muito baixa para um número muito grande de firmas (fato que diferencia o Brasil de pares como Chile, Colômbia e China) – o que explica, em parte, o item (2), pois há uma vasta gama de empresas improdutivas que não fecham e nem saem do mercado.

Além dos 3 diagnósticos gerais, Veloso identificou, a partir dos anos 80, períodos em que a produtividade poderia ter crescido mais do que cresceu e períodos em que esta cresceu rápido, mas de forma não-sustentável. A ver.


A abertura comercial ocorrida no início dos anos 90, por exemplo, aumentou a produtividade, mas não como se esperava. O motivo foi que somente a indústria de transformação absorveu os benefícios de dita abertura, pois esta passou a importar máquinas e equipamentos modernos, com alta tecnologia. Por isso teve significativo aumento de produtividade. No agregado da economia, contudo, este aumento foi moderado, devido, sobretudo, à baixa qualidade na educação formal e à rigidez nas leis laborais. Deveras, a mão de obra não migrou de setores que perderam competitividade para os ganhadores. A migração ocorreu para setores igualmente improdutivos, muitos destes informais. Esse resultado vale para os trabalhadores e empreendedores, em especial, para os pequenos empresários. Todos precisariam estar preparados para mudar de setores improdutivos para produtivos e o conjunto de leis deveria ser flexível o suficiente para permiti-los migrar. Se isso é um problema hoje, mais desafiador é perceber que o mundo está entrando na 4a revolução industrial, com mudanças drásticas no mercado de trabalho.


Situação similar ocorre no México[5]. Devido à alta informalidade no mercado de trabalho, mesmo a economia sendo muito aberta (especialmente com os EUA e Canadá), poucos setores aproveitam os benefícios da abertura comercial e logram se integrar nas cadeias globais de valor. Lá, como no Brasil, há muitas empresas improdutivas, que não se beneficiam com a concorrência externa. O aumento da produtividade, assim, acaba sendo localizado e não generalizado.

Além disso, o México nos brinda com outro importante resultado. Lá, apesar do governo ter facilitado e barateado a abertura/fechamento de negócios, os resultados na produtividade também não vieram a contento. A explicação diz respeito à baixa escolaridade dos trabalhadores e empresários. De fato, a melhora do ambiente de negócio afetou apenas os trabalhadores que tinham educação similar àqueles formais[6]. Neste contexto, uma reforma positiva no ambiente de negócios teria tido resultados melhores, se as pessoas fossem mais educadas.


Essas são, portanto, lições para o Brasil: embora muito importantes, não basta abrir a economia à concorrência externa ou melhorar o ambiente de negócios. Há que focar, concomitantemente, na diminuição do número de empresas e setores improdutivos, para que o efeito positivo seja generalizado. Educação e mercado de trabalho são, neste caso, temas centrais.


Segundo o Relatório de 2018 do Banco Mundial para o Brasil[7], metade dos 50 milhões de jovens entre 15 e 29 anos apresentam algum risco de desengajamento. De fato, dos 25 milhões com algum risco, 11 milhões não estudam e nem trabalham e 14 milhões (que estudam ou trabalham) têm atraso no aprendizado ou têm emprego com poucas oportunidades de adentrar em trabalhos produtivos. Uma tragédia para a produtividade presente e futura. Isto quer dizer que, apesar do aumento dos anos de escolaridade no Brasil (3 anos em 1980 para mais de 8 em 2018), como a produtividade não aumentou, presume-se que há que focar especialmente na qualidade no ensino.

A partir da metade dos anos 90 até 2008, observou-se, além do crescimento mundial, exitosas reformas macro[8] e microeconômicas[9], que resultaram, especialmente entre 2002 a 2010, na formalização da mão de obra (carteira assinada) e das empresas (em que a produtividade destas é 3 vezes maior do que a das empresas informais)[10]. Segundo o Banco Mundial, na primeira década dos anos 2000, mais de 2/3 da redução da pobreza no Brasil resultou da geração de empregos. Além disso, houve um salto expressivo na concessão de crédito: de 25% do PIB para 50% em menos de 10 anos. Esse conjunto de políticas resultou em boa realocação da mão de obra (principalmente entre 2003 e 2008) que teve como consequência o aumento mais rápido da produtividade, muito embora tenha sido curto.


Essa brevidade ocorreu porque, a partir de 2008 até 2014, houve um cavalo de pau na direção da política econômica do país, contribuindo para a diminuição do crescimento da produtividade. No âmbito macro, a nova matriz macroeconômica foi adotada (com a diminuição “na marra” da taxa de juros) e, no plano micro, um conjunto de medidas foi imposto, tais como: a busca por campeãs nacionais, a aprovação da lei do conteúdo nacional (que no Brasil trata-se de reserva de mercado[11]), a fixação da tarifa de energia em patamar não sustentável, a proteção de empresas e setores escolhidos, os inúmeros subsídios infundados (em especial via BNDES), a imposição dos regimes especiais de tributação, etc. Foi um período em que o recurso público foi alocado de forma pouco produtiva. Segundo o Banco Mundial, estas políticas corresponderam a um subsídio (para os ricos majoritariamente) de 4,5% do PIB em 2015, nove vezes o valor gasto com o programa Bolsa Família (política efetiva para diminuir a pobreza).


As consequências de más políticas vieram a galope, tornando o ambiente de negócios mais complexo e aumentando a insegurança jurídica, que, como consequência, desencorajaram a entrada de novas empresas, desperdiçaram recursos públicos e contribuíram para que os empresários investissem na obtenção de privilégios em Brasília em vez de focarem na produtividade de suas empresas. A partir de 2014 até 2017, assim, o país entrou na pior crise da história, um problema de “origem brasileira”. O resultado foi o decréscimo na produtividade brasileira, retrocesso no processo de formalização (como consequência do desemprego) e aumento da inflação, do risco-país e do crédito subsidiado (era 1/3 subsidiado e passou para 50%).

O aumento do crédito subsidiado aliado a políticas populistas e de compadrio explica por que a produtividade do capital caiu mais do que a do trabalho neste período. Deveras, passou-se a direcionar o crédito para empresas “escolhidas pelo Estado” e não para as mais produtivas; a ter empresas estatais (como Petrobras) investindo em projetos falidos, que não resultaram em aumento de capital (Comperj, refinarias no Nordeste, etc.); além de observar investimentos sem retorno para o país, como é o caso da indústria naval e do setor automotivo. Sem mencionar a ampla corrupção, que fez as empresas Eletrobrás e Petrobras parecerem as “Torres Gêmeas brasileiras”, bombardeadas por medidas contraproducentes, piorando, assim, a alocação do capital da nação.


Em 2015, Levy, no Ministério da Fazenda, trouxe a agenda micro de volta, com foco na produtividade, que, após uma breve interrupção de um ano, foi retomada em 2017 com Meirelles. Com Ilan Goldfajn no Banco Central e Maria Silvia no BNDES, a agenda para melhorar o ambiente de negócios e diminuir a insegurança jurídica ganhou força.


Dentre o que já foi feito, destacam-se substituição da TJLP pela TLP pra novos empréstimos do BNDES (custo de oportunidade deste banco), a aprovação da lei das Estatais (que melhora a governança destas), a reforma trabalhista e a flexibilização do currículo escolar e da política de conteúdo nacional. Há diversas reformas pendentes, mas o cenário eleitoral de 2018 não tem ajudado. De fato, além das reformas tributária e fiscal, há o PL 6621, que melhora a governabilidade das agências reguladoras, e o cadastro positivo para serem aprovados.


Em economias dinâmicas, como lembra Veloso, o processo de realocação da mão de obra entre os setores é contínuo: empresas mais produtivas empregam e investem mais, concentrando a maior parte dos recursos da economia, enquanto setores e empresas improdutivas vão morrendo. É o que está por trás das ideias da destruição criadora de Joseph Shumpeter. Segundo o Banco Mundial, sem aumentar a sua produtividade, o Brasil terá poucas chances de manter os ganhos sociais do passado e a sua taxa de crescimento esperada pode se limitar a 1,3% ao ano, aquém da taxa de crescimento dos países desenvolvidos, o que afastará ainda mais o Brasil destes a cada ano.


Em suma, constata-se que o Brasil tem produtividade baixa e precisa aumentá-la. Os problemas são diversos e seria oportuno ter um único órgão que fizesse análises custo-benefício de políticas públicas transversais entre os setores, com critérios homogêneos e coordenados, com foco no aumento da produtividade. Esse papel poderia ser feito por uma das secretarias da antiga SEAE, enquanto a outra poderia seguir focando exclusivamente na advocacia da concorrência, como parte do Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência (SBDC).

Millôr Fernandes dizia que “o Brasil, é o país do faturo”, enquanto Roberto Campos dizia que “O Brasil é um país que não perde uma boa oportunidade de perder uma boa oportunidade”. Como espero que Stefan Zweig esteja correto, há uma importante agenda a ser perquirida: a da produtividade. Urge, assim, criar uma Comissão de Produtividade brasileira, uma boa opção para o Brasil ser de fato o país do futuro.


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