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Meu Calhambeque bip bip

  • Foto do escritor: rafaelk2077
    rafaelk2077
  • 17 de abr. de 2017
  • 6 min de leitura

Uber e outras inovações – como, WhatsApp, Airbnb - são tendências irreversíveis


As músicas de (Roberto + Erasmo) Carlos ribombaram nos anos 60. Em geral, estes compositores descreviam romanticamente sentimentos e acontecimentos do seu cotidiano. Como eles teriam escrito uma música para as novas tecnologias disruptivas no século XXI, como ocorre com às relativas ao Uber, Cabify, EasyGo, WillGo, etc.?


Uma de suas divertidas letras narrava a estória de um jovem que, ao deixar seu novo e adorável cadillac na oficina mecânica, teve que pegar emprestado um velho calhambeque. Ainda que aquele fato tivera lhe trazido tristeza na ocasião, para sua surpresa, porém, um broto se aproximou do carango, mostrando que, na verdade, o calhambeque não era tão nauseabundo assim. Para o jovem ficou claro que cadillacs e calhambeques podiam conviver concomitantemente.


De forma análoga, os transportes privados de passageiros com tecnologia disruptiva (como Uber, Cabify, EasyGo, WillGo, etc.) – os cadillacs de hoje – podem coexistir com os velhos taxis. Para que a população possa desfrutar dos avanços tecnológicos e para que a competição entre os diversos meios de transporte desta natureza possa se dar de forma justa, contudo, alguns ajustes nos marcos normativos de ambos precisam ser feitos.


Para compreender quais regras/leis precisam ser alteradas com o intuito de maximizar o bem-estar social, melhor recorrer alguns ensinamentos da ciência econômica e responder a duas perguntas: 1) o Estado deve regular a quantidade de licenças de táxis e o taxímetro?; 2) para o Uber ser permitido, há que regular o quê?


A intervenção do Estado se justifica quando há falhas de mercado que inviabilizam que o equilíbrio via interação demanda-oferta coincida com aquele que a sociedade gostaria que ocorresse. Dentre estas falhas, há a externalidade. Ela ocorre quando a ação de A gera consequências para B, independente do desejo de B. A poluição que uma fábrica de alimentos gera, por exemplo, causa externalidade negativa aos moradores daquela comunidade, que compram seus produtos.

Se o Estado não impuser algum tipo de regulação ao dono da fábrica, ele produzirá mais poluição do que a comunidade deseja. Dentre as possíveis soluções regulatórias, está aquela em que o Estado intervém impondo uma quantidade máxima de poluição que a fábrica pode produzir.

Esta é a lógica econômica que justifica a intervenção regulatória pelo Estado acerca do número de licenças. Supostamente haveria mais táxis nas ruas do que a quantidade que a sociedade gostaria que tivesse, se o Estado não interferisse. De fato, a congestão – que é ruim – pode vir a ocorrer quando o preço (pelo uso da rua) é zero. Este é o caso atualmente.


A congestão relevante, contudo, é a relativa ao total de veículos nas ruas das cidades e não à quantidade total dos táxis. Ou seja, a externalidade negativa é causada pelo total de veículos individuais que transitam nos centros urbanos, que cresceu absurdamente nos últimos 10 anos, e não ao volume de táxis. O Estado, portanto, deveria desincentivar o uso de todos os transportes individuais (fazendo uso de um pedágio urbano ou de um rodízio de automóveis, por exemplo) e incentivar o uso dos meios coletivos eficientes de transportes. Esta é a melhor forma de resolver o problema da congestão nos grandes centros – se for este o problema – e não restringir o número de táxis.


Não é possível afirmar, portanto, que regular o número de licenças de táxis aumenta o bem-estar. Corrobora esta tese as estatísticas brasileiras. De fato, nota-se o baixíssimo percentual de taxis com respeito ao número total de carros em algumas das principais capitais do Brasil, não alcançando nem a 2%. Por exemplo, no RJ, há 50 mil táxis, que representam 1,7% do total da frota de carros nesta localidade. Em SP, há 35 mil, que representam 0,7%. Em BH há 8 mil táxis, que representam 0,6%. Em Brasília, há 4 mil, que representam 0,3%. Por fim, em Curitiba, há 2 mil, que representam 0,2%.


Desta forma, a regulação da quantidade de licenças de táxis deve ser abolida não só pelo argumento ora apresentado, mas também para diminuir o custo dos motoristas de táxis, deixando-os mais competitivos com relação aos novos concorrentes.


Deveras, os maiores beneficiários da restrição de licenças no Brasil têm sido os donos destas licenças, não a população. Nesse país, as prefeituras concedem gratuitamente licenças para pessoa física (uma licença) ou pessoa jurídica (várias). No último caso, o dono das licenças (trader) as aluga para terceiros no mercado secundário. Caso ele não existisse, a tarifa poderia ser reduzida, pois o custo do taxista com o aluguel desapareceria. O trader tem poder de mercado e há lucro extraordinário. Quem paga a conta dessa ineficiência é o consumidor e o taxista pagador de aluguel. Não por menos o valor das licenças no mercado secundário foi reduzido com a entrada do Uber neste mercado, causando insatisfação de seus detentores (que as obtiveram de forma gratuita pelo Estado em um primeiro momento). O Uber, assim, diminuiu a renda do trader, que, por isso, faz lobby, organiza protestos e ameaça o Estado com os votos da classe. Como os consumidores são difusos e têm baixo incentivo e poder de coordenação, o Estado se vê pressionado a não alterar o status quo.


Por sua vez, as novas formas de transporte de passageiro que têm surgido, como Uber, Cabify, EasyGo, WillGo, etc. devem ser estimuladas pelo Estado da forma como foram concebidas (transporte privado) por ao menos três razões: 1) pelo aumento da concorrência, que tem resultado numa melhor oferta do serviço prestado pelos próprios táxis; 2) pelo sistema de avaliação disruptivo, que garante que o motorista considere na sua função objetivo a satisfação do consumidor e que o consumidor saiba, antes de entrar no carro, como os demais passageiros avaliaram dito motorista; e 3) pela tecnologia de precificação disruptiva, que match demanda e oferta, fazendo do preço um sinalizador de escassez, e que, por alertar antes o consumidor, o deixa livre para ele optar por outro concorrente, como o táxi. No caso do táxi, vale dizer, ocorre o oposto: em horários de demanda baixa, como o noturno, o preço é maior.


Dado que estas novas formas de concorrência são desejáveis, há que analisar se há falhas de mercado que justifiquem regulá-las. É o caso. Devido ao elevado número de ofertantes, a assimetria de informação justifica o poder coercitivo do Estado, pois seria extremamente custoso, logo ineficiente, que os demandantes fizessem certos tipos de controles. Desta forma, cabe ao Estado regular padrões de qualidade e exigências mínimas para todos (Uber, táxi, Cabify, etc.), como verificar o antecedente criminal do motorista; o ano, o tipo e a documentação do veículo, etc.


Com respeito ao taxímetro, nenhum dos tipos de serviços, que inclui táxi, deveria ser regulado pelo Estado. Cada um deveria ter o seu sistema próprio de precificação (uniforme para cada tipo), fomentando a competição entre eles. No caso dos táxis, cujo taxímetro é regulado pelo Estado, este deveria passar a ser indicado por uma cooperativa privada, passando a ser um serviço privado, como os “demais cadillacs”. Assim, todos passariam a prestar um serviço privado – devidamente regulado pelo Estado nos quesitos relevantes para minimizar as reais falhas de mercado que este segmento produz – competindo com condições isonômicas e não discriminatórias, alijando, assim, a concorrência desleal. Além disso, o subsídio dado aos taxistas na compra de seus taxis deveria findar, uma vez que os demais tipos não têm este benefício.


A concorrência tem trazido desconforto para os ofertantes-incumbentes, o que é normal. É a destruição criadora de Schumpeter, necessária para se ter avanços na economia. A percepção de que o preço do táxi é alto, por exemplo, só veio à tona quando o Uber tirou o monopólio dos táxis, brindando um serviço de qualidade superior a um preço mais competitivo, mesmo tendo que transferir 20%-25% do ganho para a matriz e, como já dito, mesmo tendo que comprar o carro sem subsídio.


Sabe-se que a concorrência desleal é indesejável. Por esta razão, o Estado precisa rever o marco regulatório atual à luz das novas tendências, com o propósito de maximizar o bem-estar social. A população quer cadillacs, logo, são os calhambeques que precisam se adequar. Só assim os táxis competirão com o Uber, Cabify, EasyGo, WillGo, etc. sustentavelmente. Não deve, por sua vez, aprovar leis que inviabilizem ditas novas plataformas ou que as transformem em calhambeques. Amarrar-se ao status quo coloca um “pé no breque”, atrasando o progresso brasileiro. O Uber e outras inovações – como internet, whatsapp, Air bnb e outros serviços compartilhados - são tendências irreversíveis. Rejeitá-las seria um grave erro.


Se aqueles compositores tivessem que escrever uma letra para as tecnologias disruptivas atuais, muito provavelmente o Uber seria o novo Splish Splash daqueles compositores neste momento. Se naquela época estavam felizes dando um beijo estalado no cinema, no Uber, ficariam felizes em terem serviços com maiores oferta e qualidade, a um menor preço.


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